O LAGO DE CORUPUTUBA

A foto acima obtive em 1967 com a minha antiga Bieka. É o lago da Fazenda Coruputuba, em Pindamonhangaba.

domingo, 30 de outubro de 2011

Abrigo

Meu nome é paz
Agora que me ergo em espuma
Acompanhando a extensão da praia
E refluo em seguida para me atirar de novo
Desenhando na subida o que apago na volta.

Meu nome é luz
Agora que abro meus braços leves dentro
Das nuvens que flutuam transparentes
Sobre a mata que protege todos os meus morros.

 
Meu nome é perfeição
Agora que chovo sobre toda a enseada
E a escureço da Cabeçuda até a Almada
E me filtro na direção dos riozinhos surpreendidos.

 
Meu nome é eternidade
Agora que pulso na persistência dos passarinhos
E descrevo a história da vida humana
Na curva descendente do voo da gaivota.

*  *  *

Poema de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
Livro “Terra Vegetal” – Reg. Biblioteca Nacional: 133.608

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O Paraíba



Em 1960 eu estudava neste prédio onde agora trabalho, o Palacete Visconde da Palmeira, ou seja: o Museu. Estava cursando a primeira série do ginásio. Meu irmão Zaga estava na segunda. Tinha vez que a gente chegava de Coruputuba e ficava sabendo que não ia ter aula, ou a aula ia começar mais tarde.

Então a gente descia para o Bosque, que era cercado por um muro todo arrebentado. Entre o Bosque e o Paraíba havia uma rua. Quer dizer, era uma estradinha. E o gostoso mesmo era sentar no barranco e ficar olhando o rio, vendo as coisas que aconteciam.

Passava uma barcaça carregada de areia, comandada por dois camaradas munidos de longas varas que cutucavam o fundo do rio. Nada de remo. A gente via que os homens estavam fazendo um baita esforço.

Um pescador numa canoinha, do lado de cá. De repente, dava na telha dele de atravessar o rio, ir pescar lá na “ilha”. Então ele ia subindo o rio, beirando o capim, aproveitando que na margem a correnteza corre para cima. Quando já tinha se distanciado bastante, aí sim ele punha a embarcação no meio do rio. Ia atravessando enviesado e chegava do outro lado num ponto muito abaixo de onde tinha começado.

E recomeçava a pescar.

Alguns bois vinham sendo tocados por um cavaleiro, com destino ao matadouro, que ficava onde hoje é o DOV. Um dos bois se espantou e pulou no Paraíba. Saiu nadando lindamente, rio abaixo, quase todo afundado. Só apareciam os chifres, os olhos e as narinas muito abertas.

Aí a gente levantava e subia a ladeira, estava na hora de começar a aula, ou de irmos embora para casa no ônibus do Seu Ciro Valentini.

Mas até mesmo nos dias de aula normal eu olhava para o rio, lá de cima, pela janela da biblioteca. Estavam retificando o traçado, grandes máquinas trabalhavam o dia todo, escavando, escavando. Tiraram as curvas, o rio ficou mais rápido, diminuíram as cheias. Mais tarde, nos anos setenta, com a construção das barragens de Santa Branca, Paraibuna e Igaratá, daí que desapareceram mesmo as grandes cheias.
Da retificação sobraram uns braços mortos do rio, em forma de grandes meias-luas. É o Paraíba-Velho, dizíamos. Trechos parados de um rio outrora cheio de meandros. É onde dormem as garças.

* * * * *
Texto de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
Fotos:
1- Arquivo Histórico Dr. Waldomiro Benedito de Abreu - Pindamonhangaba - SP
2- Google Earth

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Tarde na serra


Debaixo deste céu azul, em outras partes,
há gente e há pensamentos
e há sonhos sob essas nuvens brancas.

Sentimos no soprar desta brisa
soprarem os ventos de outros climas,
falando com outras árvores,
roçando outras relvas,
despetalando outras flores.

Iluminados por este sol
há, além dos horizontes, outros povos e mais cidades

e mais gente sonhando sob as nuvens brancas.

Há, descendo de outras serras, outros regatos
e mais pedras rolando em outros rios
e mais melancolias, e mais crepúsculos.

Há por toda a Terra nesta tarde
as vozes e os sonhos de todas as pessoas.

*  *  *

Poema de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
Livro “Terra Vegetal” – Reg. Biblioteca Nacional: 133.608
Fotos do autor (sendo que a segunda foto eu obtive com a minha já famosa Bieka em 1967, no Ribeirão das Oliveiras)

terça-feira, 11 de outubro de 2011

O irmão do filho pródigo

Antipático o irmão do Filho Pródigo!
Não nos conta a história se ele errou
Ao menos uma vez na vida.
Mas todas suas boas ações
Ele as tinha anotadas.

E tinha, no julgar, aquela dureza própria
De quem nunca errou, não tendo oportunidade
De se humanizar no seu erro.

Inconcebível, para ele,
Sair ao encontro do irmão errado
Para abraçá-lo
Pois o abraço supõe compreensão.

Garanto que o Filho Pródigo seria
Muito compreensivo, humano,
De perdão fácil, pois descobriu o sabor
Do erro e do perdão.


*        *        *
Poema de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
Livro "Terra Vegetal" - Ed. Scortecci - Reg. B.N. 133.608