O LAGO DE CORUPUTUBA

A foto acima obtive em 1967 com a minha antiga Bieka. É o lago da Fazenda Coruputuba, em Pindamonhangaba.

domingo, 9 de dezembro de 2018

Dos terraços do Museu



Se fosse apenas para guardar coleções preciosas, não seria um Museu. Seria um cofre de colecionador, para deleitar uns poucos escolhidos.

Mas um Museu deve deleitar a muitos. Deve encantar todos os seus visitantes. Cada pessoa que percorrer suas salas, observar suas exposições, conversar com seus monitores – cada visitante, tocado pelo que viu e ouviu, ao terminar uma visita, deve sair diferente da pessoa que era ao entrar. Deve ter se tornado uma pessoa melhor. Se a visita foi bem realizada, sairá imbuída de um sentimento de sacralidade em relação ao passado.
A visita ao Museu deve ser epifânica.
Para os visitantes do Museu Histórico e Pedagógico Dom Pedro I e Dona Leopoldina, de Pindamonhangaba, a missão é facilitada – justo por estar o Museu instalado num prédio mágico: o Palacete Visconde da Palmeira.
O acervo é maravilhoso e raro. E o prédio, em si mesmo, é a mais importante peça do acervo. Mas, independentemente da contemplação e do estudo das exposições, a magia pode ser alcançada simplesmente olhando-se pelas janelas. Olhando com atenção e ternura através das janelas do Palacete, para contemplar um cenário que começou a ser montado há milhões de anos.
Quando, na década de 1860, o construtor Chiquinho do Gregório, sob encomenda do então Capitão Antonio Salgado Silva (depois Barão e Visconde da Palmeira), começou a erigir o magnífico prédio hoje intitulado Palacete Visconde da Palmeira, almejava um prédio aberto à luz solar e com ampla visão das serras que adornam a região.
Isto, quem nos conta são as próprias linhas arquitetônicas do solar, sua posição na topografia da cidade, seu elevado número de janelas e, em especial, seus dois terraços voltados para o norte.
Dispondo de consideráveis recursos financeiros, o proprietário poderia, para tal edificação, ter adquirido terrenos onde bem lhe aprouvesse. Porém, escolheu um lote no topo da ladeira, próximo à Matriz, com frente para o movimento da urbe que prosperava – porém, com os fundos voltados para a tranquilidade verde da paisagem do Vale.
Essa visão é um bem público de valor inestimável. De modo especial, o que nos encanta todos os dias, despertando nos visitantes do Museu momentos de contemplação silenciosa, é a deslumbrante vista que se tem da Serra da Mantiqueira, a partir dos terraços e das janelas do andar superior. Complementa tal visão, como moldura natural, a exuberante vegetação do Bosque da Princesa, o rebrilhante leito do Rio Paraíba do Sul, as várzeas cujo colorido vai cambiando durante o ano em função do ciclo vegetativo do arroz, e as árvores plantadas nas ruas e jardins da cidade, em direção ao Crispim ou à Boa Vista.
Do terraço superior do Palacete, em dias limpos, avistam-se quase 220 quilômetros de Serra da Mantiqueira, desde o Maciço de Itatiaia, a leste, até o sopé da Pedra do Cume, a oeste. Sendo que, do Palacete, o Maciço de Itatiaia dista 130 km e a Pedra do Cume 90 km. De leste para oeste, avistamos alguns dos pontos mais elevados da região:
O Maciço de Itatiaia, com seus picos altíssimos, entre os quais o de Agulhas Negras (2.787m), a Pedra do Sino (2.670m), a Pedra do Altar (2.665m) e o Morro do Massena (2.609m);
O Pico dos Três Estados (2.665m);                                                          
A Pedra da Mina (2.798 m), ponto culminante da Serra da Mantiqueira e do Estado de São Paulo, entre Passa Quatro (MG) e Queluz (SP);
O Pico dos Marins (2.420m), em Piquete (SP);
Acima do Bosque da Princesa, o Pico do Itapeva (1.950).
O Pico do Diamante (que, como o anterior, está dentro do município de Pindamonhangaba).;
No trecho da Mantiqueira em Pindamonhangaba, o Morro do Trabiju, a Usina Isabel, o caminho para o Sul de Minas, com seu túnel iluminado;
Mais à esquerda, o Pico Agudo (1.634m), em Santo Antônio do Pinhal; e,
No extremo oeste, as montanhas em torno da Pedra do Cume (1.600m), na divisa dos municípios de Joanópolis (SP) e Extrema (MG).
Não são apenas as grandes altitudes, no entanto, que estão providas de interesse. São visíveis também as passagens de transposição de Mantiqueira, desde séculos utilizadas – e até hoje – para se acessar as terras de Minas Gerais: a passagem do Embaú e a Garganta do Piracuama. Estas passagens estão para sempre ligadas à nossa História. Pela passagem do Embaú subiu o Padre Faria para ir descobrir ouro e fundar Vila Rica. Pela Garganta do Piracuama subiu Emílio Ribas levando os trilhos a Campos do Jordão, abrindo um caminho em busca da saúde.
Rolando suas águas no rumo leste, buscando lentamente o mar, o Rio Paraíba do Sul tem trechos visíveis a partir do terraço. Caminho dos bandeirantes e definidor da fertilidade da várzea, mercê de suas cheias ritmadas há milênios, seu curso interessa a estudiosos de várias áreas do conhecimento.
Ao contemplar o Paraíba correndo de Oeste para Leste junto ao Bosque, num dos poucos meandros deixados pela retificação do curso nos anos de 1960, o espectador se lembrará de que, às suas costas, o mesmo rio está correndo de Leste para Oeste, lá no meio da Serra do Mar. Só nas proximidades de Guararema é que o rio começa a fazer a curva para a direita, completando essa curva em Jacareí e, a partir daí, vem descendo direto em direção ao Estado do Rio de Janeiro.
Já a Serra da Quebra-Cangalha, apesar de ocupar a região sul do município de Pindamonhangaba, tem um bom trecho visível do terraço do Palacete, principalmente em direção leste. Os morros mais visíveis, localizados em Roseira e Aparecida, despidos da vegetação nativa, contam-nos a história da ocupação agrícola da região, marcando a passagem do café e, mais recentemente, das pastagens para o gado leiteiro e de corte.
Um professor, falando a seus alunos sobre vales e montanhas, rios e várzeas, entradas e bandeiras, cidades paulistas e cidades mineiras, ocupação humana e equilíbrio ecológico – se estiver falando a partir do que se vê das janelas e terraços do Palacete Visconde da Palmeira, estará transmitindo informações e valores de um modo significativo, diferente das aulas dadas apenas com a lousa e o giz.
Claro que todo Museu deve dirigir seus visitantes ao estudo do acervo. Mas talvez seja uma boa ideia simplesmente convidar os visitantes a contemplar a paisagem que se vê dos terraços e das janelas.
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Texto e foto de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes

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