Já tive quintais que, de tempos em tempos, me reservavam a visão de coisas surpreendentes.
Nessa expectativa, em diferentes fases da minha vida, antes de tomar café, eu abria a porta da cozinha e saía a descobrir as novidades:
Canudinhos verdes saindo da terra úmida: era o milho que germinava;
Ameixas, ontem verdolengas, agora amarelinhas;
Mangas maduras no chão, derrubadas pela chuva;
Uma dezena de pintinhos, bolinhas amarelas fofas, correndo atrás da galinha choca;
A cabritinha nascida de madrugada – e já dando cabeçadas no galo e nos cachorros;
A amoreira invadida pelos passarinhos, o chão pintado de frutinhas cor de vinho;
Um passarinho morto pela chuva, a ventania tinha exagerado na brutalidade;
Num dia memorável, o chão estava coberto de plumas que vieram de uma paineira muito distante.
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Hoje o meu quintal é uma estreita fita de cimentado e as surpresas são raríssimas.
Neste pequeno cimentado, no entanto, já surgiram aos meus olhos ainda sonolentos:
Um pombo machucado;
Uma pipa com rabiola e um pouco de linha;
Uma bola de bexiga, vestígio de alguma promoção de loja;
Um filhote de morcego, perdido, se arrastando;
Uma aliança, por certo atirada com raiva através da janela de um dos apartamentos vizinhos;
Uma florzinha que brotou na trinca do muro.
Só isto – e assim mesmo com intervalos de alguns anos.
Mas não perco a esperança: todo dia, antes de passar o café, saio para olhar o quintal.
O que espero? Que tenha brotado uma árvore? Que tenha nascido, do nada, uma ninhada de coelhinhos? Que tenha aterrizado um disco voador?
Não sei, mas sempre vou olhar.
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Texto de PAULO TARCIZIO DA SILVA MARCONDES
Créditos das fotos:
Pintinhos: Tatiany Cristina Kazmierczak
Cabras: http://manizales.olx.com.co
Pássaro: Antonio CBC Lopes
Coelho: http://pt-pt.facebook.com/note.php?note_id=184690784898079