O nosso Galo Índio era filho da Mãe-do-Galo.
A Mãe-do-Galo era a galinha mais brava do quintal. Só ela que podia dormir no poleiro mais alto do galinheiro. Dali de cima ela bicava com força qualquer galinha ou frango que quisesse sair dos poleiros mais baixos. Ela é que mandava. Bicava até o Galo Índio, e ele não fazia nada.
O Galo Índio era muito bonito. Era vermelho e preto. O Pedro falava que ele era do Flamengo. As penas da cauda eram muito compridas, faziam uma curva bem redonda. Quando ele ficou adulto, as esporas ficaram grandes e perigosas.
Ele não tinha crista e eu achava isso muito bom. O Galo Velho, que tinha sido o rei do quintal antes dele, tinha cristas vermelhas enormes e por isso ficava muito machucado nas brigas. Mas o Galo Índio não. Sem crista ele podia brigar quase sem se machucar.
Eu entendia a fala do Galo Índio. Minhas irmãs falavam que isso era coisa de doido. Mas eu entendia sim. Pela voz dele, sem olhar, eu sabia o que ele estava querendo dizer.
Ele tinha uma fala para chamar a galinhada quando encontrava minhoca ou cupim. Tinha outra fala para avisar que a gente já tinha colocado água na vasilha. E tinha uma voz especial para avisar os pintinhos do perigo, quando passava algum gavião.
Mas saudade de verdade eu tenho de escutar o Galo Índio nas madrugadas frias de lua cheia. Primeiro ele batia as asas três, quatro vezes. Depois cantava comprido, comprido...
Encolhido de frio na minha cama, eu escutava depois o galo branco do Seu Luiz respondendo. Depois o galo amarelo do Seu Moacir... depois, lá longe, lá longe, o galão preto da Dona Antônia. Depois... depois eu dormia de novo.
E só acordava quando o sol nascia e a cabra começava a berrar.
* * *
Texto de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
Veja também O FIM DO GALO ÍNDIO em:
https://paulotarcizio.blogspot.com.br/2011/11/o-fim-do-galo-indio.html
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