(continuação da postagem
do dia 03/fev/2013)
De primeiro (quer dizer: no tempo antigo), principalmente na roça,
se usavam palavras e expressões que não se usam mais. Vamos prosseguir
relembrando o seu significado, observando que algumas delas são solenemente
ignoradas pelos dicionários:
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AH É, BÉ? MAMÁ NA VACA OCÊ NÃO QUÉ? Expressão que
se usa em resposta a alguém que está pedindo ou exigindo grande favorecimento
sem precisar se esforçar. Não confundir com a expressão “AH, VAI MAMÁ NO BOI!” Esta
significa apenas “Não me amole, não fique me aborrecendo, vai fazer alguma
coisa, vai ver se estou na esquina!”.
·
AZEITE! Com o sentido de “Azar!”, é uma interjeição
malcriada para indicar menosprezo diante de uma advertência ou repreensão. Ex: O
adulto diz para o rapaz levar a capa porque vem chuva forte. De mau humor, o
rapaz responde “Ah! Azeite!”. Quer dizer que não está ligando a mínima para a
tal chuva. Esta expressão precisa ser acompanhada de
um levantar de ombros executado rapidamente uma ou duas vezes. Também
se pode usar a fórmula mais completa “AZEITE, CAFÉ COM LEITE!”
·
BOCÓ. Pessoa boba, lerda, sem iniciativa,
fácil de tapear. Para indicar que o grau de bobice é ainda maior, pode-se usar
o superlativo BOCÓ DE ARGOLA.
·
BONDE. Ônibus. Ex: “O bonde do Seu Ciro já
foi, agora tem que pegar o Marrom lá no Portão”.
·
BROTO. Mocinha, moça nova, menina-moça,
namorada.
·
CASINHA. Banheiro fora de casa, no quintal.
Ex: “Dá licença que tenho que correr lá na casinha!”
·
CHISPA! Interjeição: Sai daqui! Sai fora!
Geralmente se fala: “CHISPA DAQUI”.
·
COISA! ou COISINHA!. Vocativo que se usa
quando não se sabe ou não se lembra do nome da pessoa. Ex: “Ô... Coisinha! Me
empresta o caderno?”
·
COISAR. Verbo que substitui qualquer outro
verbo do idioma, quando a gente não se lembra da palavra certa ou está com
preguiça de pensar. Ex: “Precisa coisá a antena, a TV não ta pegando direito”.
·
DADA. Pessoa sem timidez, que se relaciona bem
com os outros, não se avexa de conversar com as pessoas, principalmente com os
adultos. Ex: “Gostei do seu amigo, meu filho, ele é um rapaz dado”.
·
DADINHO DADÃO, QUEM TOMA É LADRÃO. Significa
que aquilo que foi ganho por doação não pode ser tomado de volta pelo doador.
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DE MEIA-TIGELA. Falso, sem o valor que diz possuir. Qualquer
profissional despreparado. Ex: “É um doutor de meia-tigela.” Uma variante com o
mesmo significado: DE MEIA-PATACA.
·
DEVASSADO. Ambiente muito aberto, sem
privacidade. Ex: “Fecha a cortina, passa gente na rua, não gosto da casa
devassada desse jeito.”
·
DISGRAMADO. Substituía a palavra “desgraçado”,
que era proibida porque lembrava as maldições bíblicas. Mas tinha o mesmo
significado. Do mesmo modo, em vez de xingar “Você é um desgracento!”,
dizia-se: “Você é um DISGRAMENTO!“.
·
ECO! Interjeição de admiração. Mas pode ser
usada também para mostrar satisfação diante do castigo que sofreu quem fez
alguma coisa errada: ECO! BEM FEITO!
·
ENTROXADO. Cheio de alguma coisa, farto. Ex: “Foi
na loja e saiu entroxada de compra”.
·
ENTRÓXE! Expressão muito malcriada que se usa
quando se é obrigado a entregar para outra pessoa algum objeto que ela
reclama como seu. Outra expressão, mais branda, usada nas mesmas ocasiões é
ENGULA!
·
ESPECULA. Pessoa que fica perguntando muito,
principalmente sobre assuntos que não lhe dizem respeito. Ex: “Olha, nós vamos
na casa da sua tia, mas não fica especulando aquela história do filho dela, que
ela não gosta de falar daquilo”.
·
EU HEM, ROSA? Indica resposta
firmemente negativa: “Nessa eu não caio!”. Há variantes da expressão, mas com o
mesmo significado, como por ex: “EU HEM, BOI?” Outra variante: “HOME NÃO!”.
Esta última variante apresenta também uma forma mais extensa: “HOME NÃO, MUIÉ
DE MONTÃO!”
·
FIO DA PULÍCIA. Algumas famílias proibiam a
expressão “fio da puta”, por isto se usava o “fio da pulícia” com a mesma
intenção. Variante: “FIO DE UMA BOA MÃE!”
·
FOI NA ROÇA PERDEU A CARROÇA. Significa que
quem se ausenta perde a vez, perde o lugar, perde o direito que tinha etc.
·
INVOCADO.
Pessoa que leva tudo a mal, quer brigar por qualquer coisa, facilmente
julga que está sendo prejudicada ou que a estão provocando. Ex: “Não vamos
ficar junto com esse cara na festa não. Ele invoca por qualquer coisinha,
queima a cara da gente.”
·
JACU. Pessoa muito caipira, sem vivência das
coisas da cidade e que, por isto mesmo, erra muito no trato com as pessoas.
Pessoa envergonhada, tímida. Se o grau de caipirice é muito grande, pode-se
empregar uma expressão mais forte: JACU DO MATO. Um sinônimo de JACU é
MOCORONGO. A pessoa que consegue somar as qualidades do MOCORONGO com as do
BOCÓ seria um BOCOMOCO.
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LAMBETA. Pessoa que se intromete nos assuntos
dos outros, ou pessoa mexilhona, que mexe no que não é seu. XERETA tem mais ou
menos o mesmo sentido.
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LAMBISGOIA. Mulher magrela. Ou então, pessoa
intrometida. Mulher sem-vergonha, mais ou menos o mesmo que SIRIGAITA.
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MAGRELA. Bicicleta.
·
MARDIÇUENTO. A palavra “amaldiçoado” não podia
ser falada, era proibida. Da mesma forma, a palavra “maldito”. Usar essas
palavras era pecado grave, por isto se usava o “mardiçuento”, com o mesmo
sentido daquelas. Uma variante: “MARDELO!” Outra variante: "MARDISGÜELO"
·
METADE DA MISSA. Alguma parte de uma
informação. Usa-se na expressão depreciativa: “Fica quieto que você não sabe da
missa a metade”. Significa que a pessoa está dando palpite sobre um assunto que
não conhece direito, ou sobre um acontecimento do qual ela só teve conhecimento
parcial.
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NÃO SEI, NÃO QUERO SABER E TENHO RAIVA DE
QUEM SABE! É uma resposta malcriada, para encerrar a conversa diante de
perguntas muito insistentes ou desagradáveis.
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NEM NÃO! Significa Sim! Claro!
Sem dúvida! Ex: – Você vai no carnaval da Tuia? – Nem não! Já to lá!
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OBRA. Significava fezes, troço. OBRAR era o
mesmo que defecar. Ex: “Ainda não sarou a diarreia não. O bebê ainda ta obrando
mole”.
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PÃO. Expressão que as mocinhas usavam para se
referir a um rapaz muito bonito.
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PASSAR UM TELEGRAMA. Ir ao banheiro, para
fazer as necessidades, principalmente defecar. Hoje em dia se diz: “Tenho que
fazer o número dois.”
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PRESTIMOSA. Mulher prendada, caprichosa nos
serviços domésticos.
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PUXO. Dor de barriga muito forte, geralmente acompanhada
de diarreia. Ex: “Deu uma dor de barriga de puxo nele, que o coitado quase que virou
no avesso!”
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SOU BOBO, MAS SOU FELIZ, MAIS BOBO QUEM ME DIZ.
Quando não se encontra argumentos para se defender de algum insulto, usa-se
esta fórmula. Na mesma situação, se o ofendido não conseguir pensar em nada
mais inteligente para falar diante do insulto, pode usar a forma simplificada: AH
É, AH É? EU QUE SOU BOBO, NÉ? SEI.
·
TARZÃ DE PÉ DE COUVE. Pessoa que se diz forte
ou valente, mas na verdade não é nada disso; pelo contrário, é pessoa fraca ou
covarde.
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TIRAR A CALÇA E PISAR EM CIMA. Resposta
malcriada diante da revolta da pessoa que se sente prejudicada. Significa mais
ou menos “Dane-se!” A expressão completa é esta: “Não gostô? Tira a carça e pisa em cima!”
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VAI ELE! Interjeição de admiração e, às
vezes, de algum descrédito diante de uma informação espantosa. Ex: “– Mãe, caiu um calipero atrás da escola! – Vai ele, fio!”
·
ZONGO. Pessoa meio lerda, desligada, aparentando
certo grau de bobeira. Pessoa que não se manifesta, não participa direito das
atividades dos colegas. Sinônimo: ZONGUERA. Sinônimo aproximado: BABUJA.
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Este
dicionário está (e estará sempre) em fase de ampliação.
Texto
de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
Boa, Paulo!!! Morri de rir das expressões usadas até hoje por minha avó e, consequentemente, minha mãe.
ResponderExcluirTenho um sinônimo para Lambeta: Cuié.
Já ouvi muito essa também. Grande Abraço!
Paulo Tarcizio: muito bom! Parabéns! Eu que vivi em Pinda até os meus 11 anos, o "Dicionário da Roça" fez-me lembrar dos bons tempos. Fui um "Jacu do Mato". Rsrs.
ResponderExcluirCiro Yoshinaga. 26/12/2013.