Estava
boa a troca de idéias entre o Glauco, o Céfalo, o Sócrates e o Polemarco, na casa deste, depois que voltaram da festa da Diana. Mas o Trasímaco ficava toda
hora querendo interromper a conversa, queria impor a conclusão dele, de que a
vida do injusto é mais vantajosa do que a do justo. E ainda mais: que governar
é simplesmente impor aos governados o interesse do governante. Então o Sócrates
lembrou aos parceiros que, conforme já tinham discutido, toda arte ou governo
deve providenciar o que é vantajoso para os subordinados. Assim, a medicina
visa ao bem dos pacientes, o músico visa agradar aos ouvintes, o construtor
visa o conforto dos moradores e assim por diante.
Da
mesma forma, prosseguiu o Sócrates, o governante deve providenciar benefícios para
os governados e não para si próprio. E assim, já que o governante está cuidando
dos interesses dos outros, deve receber paga por seu trabalho. Por isto, ao
governante se deve dar salários, sob a forma de dinheiro ou de honras e, em
caso de recusa do ofício, sob a forma de punição.
Nessa
altura, todos estranharam muito e interpelaram o Sócrates: Como assim? Pagar o
governante com dinheiro ou honras a gente compreende. Mas a punição como paga?
E o
Sócrates explicou: Punição para o virtuoso que não quiser governar, que recusar
o cargo de mando. É só isto que funciona para o homem de bem. Porque ele não
vai disputar o governo em troca de dinheiro, não é mercenário. Não vai disputar
em troca de honras, pois não é ambicioso. A verdadeira paga para o homem de bem
que assume o governo é esta: escapar da punição de ser governado por homens
inferiores a ele.
Pois
este é o verdadeiro castigo para o virtuoso que se recusa a governar: Honesto,
será governado por desonestos; inteligente, será governado por burros; culto,
será governado por brutos; solidário com as dificuldades dos pobres, será governado
por aproveitadores; conhecedor dos caminhos modernos, será governado por retrógrados.
Para
deixar ainda mais clara a sua convicção, o Sócrates completou: Se houvesse uma
cidade constituída só de bons, haveria competição para fugir ao poder,
precisamente como agora existe para o alcançar. Os homens bons disputam o poder
não porque esperam usufruir vantagens, mas apenas porque não encontram quem
lhes seja superior ou igual para lhe passar a missão.
Depois
dessa, o Trasímaco baixou um pouco a bola. E a conversa na casa do Polemarco
prosseguiu até bem tarde.
Isto
aconteceu em Atenas, uns quatrocentos anos antes de Cristo. Quem contou para a
gente foi o Platão, discípulo de Sócrates. Por essas e outras vocês sabem o que
acabou acontecendo com o Sócrates: foi obrigado a se matar tomando veneno.
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Texto
de Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
Foto de
Greg O’Beirne
Permissão
de uso: GFDL / Creative Commons
Comentários
sobre a imagem: Socrates bust by Victor Wager, University of Western Australia,
Crawley, Western Australia. Photograph by Greg O'Beirne, taken 3rd December
2004, 8.55am.Category:Perth, Australia
Quantos anos se passaram na história da humanidade e infelizmente os homens de bem ainda estão fora do poder que governa o Planeta Terra....
ResponderExcluirQuantos anos se passaram na história da humanidade e infelizmente os homens de bem ainda estão fora do poder que governa o Planeta Terra....
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